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20 de janeiro de 2018

PARÁBOLA DA CASA DE BANHO



Ela tinha acabado de sair, mas as luzes iluminavam, ainda, a casa de banho. Ouviu-se o espelho falar:
- Vocês viram como a Senhora se mira e remira bem dentro de mim e se olha bem no meu interior, penteando-se, maquilhando-se, olhando o rosto tão cuidadosamente? Tudo, tudo através das profundezas do meu ser.

Logo que as luzes se apagaram e tudo se confundiu na escuridão, o sensor de abertura das luzes, com riso trocista, respondeu-lhe assim:
- E agora? Não seja eu a acender as luzes e as profundezas do teu ser e não passas de um vidro no escuro.
- E a luz do dia? Não há luz do dia?
- E à noite? O que seria de ti se eu não existisse?

Seguiu-se um pouco de silêncio. Depois, ouviu-se a voz da banheira:
- Mas sou eu e os meus associados que mantemos a Senhora perfumada, com cabelos brilhantes e sedosos.
- Pois, pois! Mas sou eu (eu!) que de entre todos vós, o que melhor lhe conhece as partes mais íntimas. (Pelo tom marialva, todos reconheceram o bidé).
Falou, então, o lençol de banho, com a inconfundível voz delico-doce:
- Ai! Não se esqueçam de mim, não se esqueçam de mim! Eu conheço-lhe o corpo todo... Todo.
________

Quando a noite ia já longa, começou a ouvir-se um choro baixo, tão baixo quanto de onde ele vinha. E uma voz chorosa, quase inaudível:
- Todos me pisam, todos me pisam.
Noite dentro, ia repetindo:
- Todos me pisam. Sou de mármore rosa, de Carrara e ninguém dá por mim. E todos me pisam.

A sanita, que ouvira tudo (como habitualmente), apesar de estar em condomínio privado, com porta própria, acompanhada dos seus nuitos adereços, já cansada de o ouvir, berrou-lhe:
- CALA-TE! CALA-TE! A MIM TODOS ME CAGAM EM CIMA!