Teria quase noventa anos.
Morreu, mas, antes de morrer, já há muito tinha "morrido", excepto no prazer de fumar. Não incomodava, não exigia, não pedia, não... estava. Arrastava-se lentamente pela casa, amparado aos móveis e às paredes.
Sentava-se à mesa mais para fazer prova de estar vivo do que para comer ou beber. Comia pouco, muito pouco.
O mais do tempo passava-o sentado. Deitado, não. Odiava a cama. Só à noite para tentar dormir. Tentar...
Gostava de estar à janela, encostado ao peitoril. Não pela vista da rua ou das pessoas. Era pelo prazer de fumar, apesar da bronquite asmática que lhe dificultava a respiração e causava tosse. Tossia muito.
Fumava assim, "clandestinamente", contrariando as recomendações médicas e às escondidas da família, que era, afinal, conhecedora. Tinham, também, conhecimento que a compra dos cigarros era feita pela empregada doméstica. Fumava cigarro após cigarro, apagando as "beatas" contra guardanapos de papel humedecidos, que, depois, lançava, discretamente, na sanita.
Apagou-se...
Nunca mais o viram à janela e a casa nunca mais ouviu a sua tosse.
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