Acordou.
Estava deitado de costas dentro do barraco, em cima das tábuas e dos cobertores.
Lá fora chovia uma chuva miudinha, peganhenta.
Gosava o descanso da manhã de domingo. Sentia a boca como que cheia de pêlos, por causa dabebedeira ainda mal curtida.
Um gato forçou levemente o buraco da porta e assomou à soleira. Logo que verificou que estava gente, fugiu.
Já não se sentia novo e, na vida das obras, ora havia trabalho, ora não. Não tinha possibilidade de arranjar outra vida e voltar para a aldeia é que não. Nunca.
- Puta de vida...
Lembrou-se que, no principio da noite anterior, tinha pensado, outra vez, matar-se. Tinha que ser de raiva, coisa que desse brado, que fosse falada na televisão. Depois começou a baber um copo, depois outro, mais outro, o tempo foi passando e... esqueceu-se.
- Puta de vida! - pensou outra vez.
Estava nisto, quando a terra tremeu. Qualquer coisa ou alguém tropeçou lá fora e ouviu uma grande aturdida, gente a berrar, a fugir debaixo de chuva.
Uma tábua pequena caiu do tecto da barraca e foi acomodar-se-lhe no meio das pernas. Fez um sorriso cínico e pensou:
- Se houver um tremor de terra daqueles valentes, mesmo que a barraca me caia em cima, eu "auguento" bem meia dúzia de tábuas.
O suicídio foi adiado.
Sem comentários:
Enviar um comentário